terça-feira, 7 de julho de 2009

Uma análise do conto Soldadinho de Chumbo
(Hans Christian Andersen)

A situação inicial do conto nos remete para uma situação de dificuldade e restrição do herói pelo fato de ter apenas uma perna, porém existe o sentimento de superação dessa diferença, descrita na passagem:
"Mas ele ficava tão bem de pé, numa perna só, como os outros das duas"
Os conflitos estão presentes durante basicamente todo o conto. As diferenças sociais, situação essa impregnada na Dinamarca do século XIX, em que as constantes guerras enfraqueciam as finanças e aumentavam os contrastes entre a plebe e a nobreza, também estão presentes, situação essa evidenciada no trecho:
"Esta seria uma mulher ideal para mim. Mas é muito aristocrática, mora num palácio, e eu tenho apenas uma caixa de papelão, onde somos vinte e cinco"
O elemento do sobrenatural é carregado pela presença do Duende e como se fosse a voz dessa sociedade de classes diz para o Soldadinho que a bailarina está acima dele.
"Soldadinho de Chumbo! - disse o duende. - Tira os olhos de lá!"
Ocorre uma ruptura quando o herói sai da proteção e mergulha no completo desconhecido. Nesse momento as aventuras vividas pelo Soldadinho fazem aflorar seu sentimento de amor e perseverança diante as diversas dificuldades enfrentadas no transcorrer do conto.
O confronto e a superação desses obstáculos e perigos, busca soluções no plano da fantasia com a introdução de elementos imaginários.
O enredo segue linear e o processo de solução dá-se pela passagem que leva o soldadinho a ser encontrado dentro do peixe e, por uma dessas reviravoltas do destino, o soldadinho vê-se novamente diante da bailarina.
O desfecho remete-nos a um final apoteótipo na qual o soldadinho e a bailarina se fundem em um só coração dando assim a sensação da transformação em algo novo.
Simbologia do Chumbo
Símbolo do peso da individualidade incorruptível. Para a transmutação do chumbo em ouro, os alquimistas buscavam simbolicamente desprender-se das limitações individuais, para atingir os valores coletivos e universais.
O chumbo simbolizaria a matéria, enquanto está impregnada de força espiritual e a possibilidade das transmutações das propriedades de um corpo nas de um outro, assim como das propriedades gerais da matéria em qualidade do espírito. O chumbo simboliza a base mais modesta de onde pode partir uma evolução ascendente.
Essas características citadas acima estão muito presentes no conto O Soldadinho de Chumbo, principalmente em seu final quando há uma transformação do Soldadinho e da bailarina em um coração.
Análise do conto
O conto O Soldadinho de Chumbo foi o primeiro escrito totalmente por Andersen.
O conto trata de um grande amor entre o Soldadinho de Chumbo e a Bailarina e durante sua narrativa aponta situações precárias da vida.
O conto não traz a tona apenas o sentimento de amor, pois trata de ética, diferenças culturais, identidade e aceitação das diferenças.
Andersen utiliza-se da animação de objetos, como brinquedos, para representar a impotência das crianças, incompreendidas e cheias de desejo que ninguém escuta.
O autor tinha uma visão do amor, beata, platônica e muitas vezes letal, levando-nos a conjecturar que ele encontrou beleza nas palavras, mas nem por isso teve recompensas no campo do amor.
Na passagem do conto em que o soldadinho é engolido por um peixe e depois ser retirado da sua barriga, podemos fazer uma analogia com a gestação, um renascer para uma nova oportunidade uma vez que, por obra do destino, foi parar exatamente no mesmo lugar de onde havia saído.
A morte do soldadinho e da bailarina não deve ser encarada como uma tragédia mas sim como uma transformação, pois é nesse momento do conto, e somente nesse momento, que os dois conseguem ficar unidos. Da união dos dois surge um coração significando o amor pela eternidade. Essa transformação que ocorre pode estar relacionada também com a simbologia do chumbo na qual é considerado a base mais modesta de onde pode partir uma evolução ascendente.
Uma análise de Diana e Mário Corso em "A infância invade o conto de fadas"
"Por isso, não surpreende que o Soldadinho de Chumbo seja uma história de amor infeliz. Trata-se de um soldadinho diferente, pois lhe falta uma perna. Em função disso, apaixona-se por uma bailarina de papel, cuja perna erguida faz parecer que ela também tem apenas uma. Fascinado pela amada, coloca-se num lugar desde onde possa contemplá-la e deixa de ser guardado com seus irmãos. Em função disso, o soldadinho sofre inúmeros revezes, cai da janela, é colocado a navegar pelos esgotos num barquinho de papel e termina na barriga de um peixe que, para seu grande espanto, é comprado pela cozinheira da casa onde morava. Mas nem essa virada da sorte propicia o amor impossível dos dois: somente na morte, queimados juntos, derrubados na lareira, eles finalmente se fundirão.
Como o soldadinho e a bailarina, as crianças estão à mercê de serem levadas para onde forças superiores quiserem. Devemos lembrar que é bem recente a ideia de consultar uma criança a respeito de se ela quer ou não ir a determinado lugar ou se está sentindo-se bem onde está. Nos tempos da infância de Andersen, crianças morariam como, quando e com quem fosse disposto que deveria ser, e pouco importava o que achassem disso. Além disso, seus sentimentos não passavam de secretas fantasias e ilusões, que o mundo ignorava solenemente."

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